Conte sua história › Marcelo Tadashi Shiraishi › Minha história
Este trecho da minha vida é sobre os momentos em que aprendi a dar mais valor às minhas origens,ao meu sangue.
Nasci em uma família de costumes extremamente tradicionais, desde a educação até nos modos e costumes cotidianos.
Minha Mãe, nascida em Fukuoka, veio ao Brasil acompanhada da família aos 7 anos de idade. Logo, todos descobriram a vida dura em um novo país. A dificuldade com o idioma, o preconceito. As diferenças eram visíveis. Após 8 anos, meu Avô veio a falecer. A vida difícil agora era muito mais dura. Mas nem por isso desisitiram. Mãe de 6 filhos, minha Avó não podia se dar ao luxo de esperar algum tipo de milagre. E assim foi. Sempre batalhando e educando os filhos, todos cresceram e seguiram suas vidas.
Anos depois, agora com seus 20 e poucos anos, minha Mãe conheceu meu Pai. Filho de imigrantes, nascido em São Paulo em uma família já de certa tradição. Pai e mãe de costumes rígidos, cresceu com a imagem do japonês orgulhoso. Ingressou para o Exército e lá passou alguns bons anos.
Conheceram-se numa sala de aula por fazerem parte da mesma turma.
Anos mais tarde, o casamento, o primero filho, segundo, terceiro... e a vida seguiu.
E aqui estou eu... hoje com 22 anos. Quem me conhecer hoje vai achar que sempre fui um rapaz que seguiu as tradições e conceitos dos nossos ancestrais. Mas a verdade, é que nem sempre as coisas foram assim.
Desde pequeno, estudei em escolas especializadas para filhos de empresários japoneses morando no Brasil. Até os 6,7 anos falava muito pouco português. Quando ingressei num colégio comum a adaptação foi difícil. Idioma, costume (inclui-se neste ítem o fato de levar obentô para a escola, com onigiri e tamagoyaki, por exemplo).
Sofri muito com piadinhas e descaso. "Seu nerd","abre o olho","Arigato,Sayonara!" piadinhas básicas mas que todos aqui já enfrentaram. E a pressão em casa por parte da educação rígida e ortodoxa, não facilitava as coisas.
Tinha raiva da escola, não fazia amigos e tampouco gostava deles. Mas, no karatê as coisas eram diferentes. Era respeitado e até invejado por quem não era oriental. Na época, não entendia essa estranha... digamos, admiração.
Os anos foram passando... e não compreeender essas relações me fez odiar o fato de ser japonês. Tudo me envergonhava... até falar em nihongo na frente de outras pessoas me fazia ficar com raiva.
Tudo começou a mudar quando minha Avó materna veio morar em nossa casa. Seus costumes, seu jeito tranquilo de falar e olhar, suas comidas... a sua disciplina e dedicação com as suas atividades.
Um dia ganhei um jogo de vídeo game vindo do Japão. Ótimo! Mas tinha um detalhe, eu já não sabia mais ler, escrever e nem conversar em japonês. Pedi ajuda à minha Avó, ela com toda a paciênca do mundo, me ensinou letra por letra.
O interesse, foi imediato. Depois daquele dia, tudo ficaria diferente. No karatê, na escola, no dia a dia. Passei a sentir orgulho do que antes me envergonhava.
Passei a olhar de frente aqueles que zombavam de mim e de outros e passei a ser superior nas atitudes, na inteligência, na sutileza e também na frieza.
Era eu mesmo quem não sabia dar valor a isso e dava ouvidos a besteiras.
Hoje, tenho japonês fluente, praticante de Shodô, Primeiro DAN de karatê pela WADO-KAI do Japão, amante da cozinha Japonesa e de todos os seus costumes e tradições. Torço até pela seleção de futebol! (Quem me conhece sabe que não meço esforços para comprar as camisas da seleção japonesa, sempre vindas do japão) E algo que me emociona é poder cantar em voz alta e de coração o hino japonês.
Tudo isso, porque me ensinaram a ter valor... me ensinaram e ver que temos uma cultura rica e muito profunda... que para entendermos ela temos que nos dedicar e ter discplina. Cultura essa, que hoje é copiada, invejada e acima de tudo, admirada por muitas pessoas.
Sou grato aos meus antepassados, aos meus pais, aos meus inimigos... e amigos ... e aos meus mestres! Que até hoje, são dois.
Buyo Sensei e Kanoe Oba-chan (In memorian) MAKOTO NI ARIGATOU GOZAIMASHITA!
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil