Conte sua história › Eduardo Jun Marubayashi › Minha história
Agosto de 1995
Quase um terço da delegação brasileira no Jamboree Mundial de 1995, na Holanda, era formado por nipo-brasileiros. Realizado a cada quatro anos, esses eventos reúnem cerca de 30.000 escoteiros de dezenas de países de todo o mundo. Cada galês, lituano, moçambicano e canadense que passava por nossos campos ficava intrigado vendo aquele monte de japoneses em verde e amarelo.
Nossa história começou no pós-guerra, quando o escotismo se arraigou na comunidade japonesa como uma alternativa sócio-educacional para as crianças da colônia que não tinham muitas opções para se divertir. Foi com essa idéia na cabeça que educadores como Shizuo Hosoe, Jurucey Pucu Aguiar e Ryozo Osoegawa fundaram em 1953 o Grupo Escoteiro Caramuru.
Quatro décadas depois éramos o maior grupo do Brasil e estávamos presentes em massa na ilha de Flevoland. Eu estava passando apressado pela praça principal do Jamboree, quando o chefe Alexandre Oliani me pediu para acompanhar o chefe Ryozo, único pioneiro ainda vivo, para uma visita de cortesia ao campo japonês. Há pouco operado na garganta, ele precisava que alguém fosse sua voz:
- Jun, você fala japonês, né?!, perguntou o Alê.
- Não.
- Serve. Com certeza você fala mais do que eu.
E lá fui eu acompanhar o Chefão. Eu e meu japonês canhestro.
Quando chegamos ao campo dos japoneses, um pequeno grupo de senhores de idade, entre os quais encontravam-se algumas das maiores autoridades escoteiras daquele país, levantou-se de suas cadeiras sob as árvores e veio ao nosso encontro. Eu, que já não estava entendendo nada, quase tive um ataque do coração quando começaram a nos aplaudir. Bom, eu não, o Chefão. Naquele momento eu só pensava em matar o Alê. Que roubada. Só foi quando o primeiro daqueles senhores chegou mais perto e cumprimentou o Chefão é que compreendi o motivo daquele encontro. Era uma pequena homenagem a ele pelo recebimento da condecoração do imperador Akihito, a ordem do Sol Nascente, por seus serviços prestados à comunidade japonesa no Brasil. Um a um eles vieram e apertaram suas mãos. Um a um aproximaram-se e dirigiram ao chefe Ryozo sorrisos e palavras de agradecimento, carinho e amizade. E aquele senhor mirradinho, mudo e frágil era agora uma figura serena e confiante, com seus olhos brilhantes e sorriso firme.
Meses depois daquele encontro o Chefão nos deixou, vencido pela doença, e o escotismo perdia uma de suas figuras mais folclóricas. Por toda minha vida ele sempre fora um velho pentelho que adorava pegar no meu pé, uma pessoa exigente com manias esquisitas. No entanto, naquele dia ensolarado e quente de verão europeu, japoneses e brasileiros o reverenciaram.
Um dos muitos homens que ajudaram àqueles que atravessaram a ponte.
As opiniões emitidas nesta página são de responsabilidade do participante e não refletem necessariamente a opinião da Editora Abril
Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil