Conte sua história › Eduardo Jun Marubayashi › Minha história
Cresci numa rua cheia de imigrantes no bairro da Saúde, em São Paulo. Meu vizinho da esquerda era o ‘abuelo’ espanhol, à esquerda vivia a ‘nona’ italiana. Meus melhores amigos eram o Marcelo, neto de alemães, o Roberto, mais português impossível, e o Pedro, de família coreana. As músicas que saíam das vitrolas e os aromas das panelas nunca eram os mesmos, por isso eu e meus irmãos não nos achávamos muito diferentes dos outros. Ser japonês era só uma esquisitice a mais naquele quarteirão.
Assistir desenhos no cine Jóia e campeonatos de soroban, comprar revistas nas livrarias Sol e Fonomag, sair correndo nos undokais e ver a velhinha vender flores com um toca-fitas à cintura na praça da Liberdade. Ah, eu me sentia super-japonês por causa dessas coisas, mas a verdade era um pouco mais complexa.
Nós éramos uma mistura maluca, mas não improvável, de diferentes gerações de imigrantes. Nossos bisavós, Keisha e Torazi Sugano, chegaram à região de Bilac em 1915, vindos da província de Fukushima. Meu avô, Satoshi Kamimura, de Niigata, imigrou em 1934 para se estabelecer no noroeste paulistano. Já meu pai, Shigeki, saiu de Tanushimaru, província de Fukuoka, direto para o navio Brasil Maru em 1955 quando tinha apenas 15 anos, sem mais ninguém da família a acompanhá-lo. Criou-se pelo interior de São Paulo até conhecer minha mãe, Yaiko, que não queria de jeito nenhum se casar com um issei, mas que no final acabou caindo na lábia e no cabelo engomado do velho. Tiveram quatro filhos que ao mesmo tempo eram nissei, sansei e yonsei.
Dormíamos à base de boi da cara preta e mikan no hana.
Éramos católicos, mas conhecíamos a liturgia budista.
Lutávamos kendo e amaldiçoamos até hoje o Paolo Rossi.
Adoramos nato e baião de dois, enfim crescemos numa típica família nipo-brasileira, mas demorou muito para entender o que isso significava...
As opiniões emitidas nesta página são de responsabilidade do participante e não refletem necessariamente a opinião da Editora Abril
Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil