Conte sua história › Atílio José Avancini › Minha história
No Japão, de abril de 2006 a março de 2007, desenvolvi um trabalho pedagógico focando a Cultura Brasileira e Comunicação no Departamento de Estudos Luso-Brasileiros da Kyoto University of Foreign Studies (KUFS). Kyoto (antiga Heian-Kyo) foi capital do Japão por mais de um milênio, da era Heian (794) à era Meiji (1868). Cidade calma e tradicional, possui vários sítios tombados como Patrimônio Mundial. Localiza-se na ilha de Honshu, região de Kansai, dista 60 km de Osaka e 500 km de Tokyo. Sua população é de 1,4 milhão de habitantes. Kyoto lida simultaneamente com a tradição e a modernidade, o Oriente e o Ocidente, o campestre e o urbano, o artesanal e o industrializado.
A KUFS – conhecida como Kyoto Gaidai – completa, em 2007, 60 anos de fundação e conta com 4800 alunos. A Habilitação em Português tem cerca de 280 alunos (70 por ano). O curso de Português tem duração de quatro anos e se iguala em procura com os de Espanhol, Chinês, Japonês, Francês, Alemão e Italiano. O destaque da KUFS, direcionada para o ensino de línguas estrangeiras, é o Inglês. Fui o primeiro professor desse convênio de 11 anos entre a USP e a KUFS. O convênio acolhe principalmente estudantes de graduação. A realização desses intercâmbios se ajusta às novas demandas de internacionalização e de modernização da USP.
O ensino no Japão se integrou às múltiplas forças sociais atuantes, que não só foram influentes nas opções no que diz respeito às condições pragmáticas em sala de aula como também determinaram comportamentos. Assim, a dinâmica pedagógica se processou num contexto educacional determinado pelas condições específicas do lugar, refletindo aspectos emocionais e intelectuais dessa comunidade, parte formadora de sua identidade.
Em Kyoto compartilhei um duplo deleite. O primeiro se efetivou nos momentos das aulas, buscando corresponder à expectativa dos estudantes japoneses de se aproximarem do modo de vida ocidental, sobretudo o brasileiro, visto como um povo descontraído, alegre, criativo e original. Reconheço, entretanto, que o interesse dos estudantes pelo Brasil veio dividido pela insegurança da perda da identidade japonesa.
De fato, o contato da ilha Japão com estrangeiros sempre foi feito com muito cuidado e receio. Apesar da alta tecnologia reinante, uma característica básica dessa cultura, inclusive entre os jovens, é voltar-se para si na observação silenciosa do mundo exterior.
O segundo deleite foi unicamente pessoal, diante do desafio de residir na antiga capital Kyoto, envolta pela atmosfera tradicional do Japão. De certo modo, meu desejo de vivenciar o estilo de vida nipônico veio acompanhado pela busca de semelhanças e antagonismos entre a identidade japonesa e a brasileira. Não foi simples administrar o choque cultural de uma cultura amorosa e vital como a nossa para uma cultura também amorosa, mas mental como a deles. Sempre é bom ressaltar que somos humanos e não há cultura ou povo superior a outro. O homem é um em qualquer parte do planeta, independente de sua língua, crença, raça ou classe social.
Para enfrentar os desafios em sala de aula e na vida cotidiana de Kyoto,
lancei-me nas áreas da literatura, arte visual e música. O caminho da socialização da arte foi decisivo para que os alunos tomassem conhecimento da Cultura Brasileira e da Língua Portuguesa com criatividade e, simultaneamente, suavizar sua própria identidade cultural. Percebi também que para trabalhar com os estudantes era necessário conhecer o ambiente geográfico, histórico e simbólico de Kyoto.
De início, constatei algumas dificuldades conceituais por parte dos alunos como, por exemplo, buscar significados, formar opinião, realizar análises de conteúdo, fazer abstrações, perceber metáforas. Mas, uma vez no Oriente, aproveitei o estado natural de concentração, ordem, exatidão e resguardo. Assim, procurei trabalhar com o poder da atenção e da organização do pensamento em torno de uma idéia central.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil