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Na verdade, o destino da família do diitchan Kanetaro poderia ter sido a Rússia. Antes de vir para o Brasil, conforme minha tia Aiko contou, ele sempre falava em ir para “Karafuto”, ou, Rússia, conforme era chamado (por eles) aquele país... ou alguma região daquele país; mais provavelmente aquelas ilhas ao norte do Japão, ainda em litígio com a Rússia. De qualquer forma, ele não queria ficar em Nigorigawa. E isso é verdade, porque a tia Aiko, nascida aqui, não se conformava, que tendo “sangue azul” e a vida confortável que tinham lá, o pai se decidira por vir ao Brasil e passar por tudo o que passaram. Então curiosa, além de inconformada, perguntou ao pai a razão. A resposta não lhe foi muito convincente, na época. O odiitchan respondeu-lhe que, desde jovem, nunca aceitara o fato de “não poder ver o horizonte” de sua casa, porque a vila de Nigorikawa, onde moravam, se localizava dentro de um vale, como se fosse a cratera de um vulcão. Aliás, um grande vulcão em atividade se localizava a poucos quilômetros dali (ouvi de minha mãe, que também nasceu lá, relatos sobre esse vulcão em erupção, e que deixaram, nela, lembranças aterrorizantes, sobre bolas de fogo na escuridão da noite, enormes e ameaçadoras). Ele sempre afirmava que ali não era o lugar ideal para se criar os filhos, porque em seu conceito queria um lugar que possibilitasse “dar-lhes mais asas”, aumentar-lhes as oportunidades de conhecimento. Por isso já pensara anteriormente em se mudar para “Karafuto”, intenção impedida pelos familiares, anteriormente. Até que surgiu o Brasil e, aí, não teve dúvidas. "De mala e cuia”, aos 43 anos, largou tudo e partiu para o Brasil com toda a família (esposa Kiyo, 32, e sete filhos – Fusa, 14; Ichio, 11; Hanaye, 9; Yoshio, 6; Kazuko, 4; Haruo, 2; Tetsuo, 1), mais a mãe Ika, 69, dois irmãos, Shogoro, 31, e Hina, 51; e mais dois sobrinhos, Koichi Shimada, 22, e Shizue, 15. Ou seja, diferentemente da maioria que veio para fazer o “pé-de-meia” e retornar, vieram mesmo para ficar! “Para dar mais asas aos filhos!” Chegaram ao Brasil no dia 2 de junho de 1932, no porto de Santos, a bordo do Rio de Janeiro Maru, procedente de Kobe.
Mas, minha tia Aiko, que “não dava o braço a torcer”, alguns anos atrás, tendo tido a oportunidade de ir para o Japão, na carona do movimento dekassegui (no caso dela, como “kaseifu”, para cuidar de idosos em hospitais e residências), pouco antes de retornar ao Brasil, em definitivo, resolveu dar um “pulinho” até a Vila de Nigorigawa, a fim de constatar a afirmação do pai. Postou-se, de pé, no meio da vila, e girou, vagarosamente, 360 graus. Só viu montanhas. Deu-lhe razão. Retornou satisfeita... e orgulhosa.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil