Conte sua história › Monja Coen/ Cláudia de Souza › Minha história
Em toda a minha infância e adolescência eu nunca havia tido contato com o budismo. Nem com o Japão. O país era uma coisa muito distante pra mim. Só com uns vinte e poucos anos de idade é que fui ter um namorado japonês. Que era o Ruy Ohtake. Na época eu trabalhava no Jornal da Tarde e me pediram para entrevistar este “jovem arquiteto extravagante e promissor”. E a gente teve um pequeno romance, muito rapidinho. Ele era muito respeitoso. Ele me trazia presentes, me convidava pra almoçar na casa da mãe dele – que era a Tomie Ohtake. Mas não chegamos a ter um relacionamento profundo.
Só mais tarde, quando eu fui morar nos Estados Unidos, é que eu comecei a me interessar por meditação. Mais ligado à Índia, nada a ver com o Japão ainda. E lá eu acabei lendo um livro sobre ondas alfa onde havia uma entrevista com um monge japonês. E esse monge falava uma coisa que me pegou. A autora perguntou: “Se nós podemos usar eletrodos para induzir alfa, então nós não precisamos meditar”. E o monge respondeu: “Por que vocês querem entrar pela janela?”
Aí eu fui procurar zen-budismo na lista telefônica e encontrei o Zen Center de Los Angeles, que era liderado pelo Maezumi Roshi, um mestre japonês. Era uma comunidade basicamente de norte-americanos. Havia pouquíssimos japoneses. A maioria das pessoas estava lá porque tinha muito interesse pela cultura japonesa. Tinham vistos todos os filmes do Kurosawa, por exemplo. Eu não. Eu não tinha visto nenhum filme dele e não me interessava pelo Japão. Era tudo muito distante pra mim.
Ao contrário dos americanos, eu não me interessei pela cultura japonesa até descobrir o zen. E quando eu descobri o mestre Dogen, fundador do zen-budismo, eu me apaixonei por ele. Eu queria entender o que ele falava, o que ele pensava. Quando eu fui para o Japão, eu fui para a terra de mestre Dogen, e não para a terra de Kurosawa, a terra do sumô, a terra da cerimônia do chá. Tudo isso veio depois.
Quando eu comecei a fazer meditação, foi uma maravilha! Eu descobri essa coisa de olhar para a parede, de manter os olhos baixos, de não fechar os olhos ao meditar. Quer dizer, o dentro e o fora não estão separados. O que está acontecendo nesta realidade é o que está acontecendo na minha realidade interior. Esta descoberta foi de uma riqueza incomensurável!
Depois de três anos de prática no Zen Center, fui ordenada monja. Para a minha ordenação, chegaram do Japão dois monges que vieram ajudar meu mestre. E esses monges, assim como ele, tinham uma suavidade no trato, uma gentileza, que me fez pensar: “Eu gostaria de ser assim”. E os três tinham estudado no mesmo mosteiro. Eu pensei: “Ah, então acho que é mosteiro! Eu quero ir para lá, eu quero ser como eles.”
Aí eu pedi ao meu mestre para ir ao Japão, mas ele não concordou. Ele havia mandado monges americanos para lá e houve uma diferença cultural muito grande. Sofreram muito e lá acabaram desistindo, todos eles. Mas eu insisti, e ele finalmente concordou.
Depoimento ao jornalista Xavier Bartaburu
Fotos: Carlos Villalba e arquivo pessoal da Monja Coen
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil