Conte sua história › Olga Futemma › Minha história
Apesar de não termos dinheiro, por algum motivo minha família sempre foi cinéfila. A gente ia muito aos cinemas japoneses do bairro da Liberdade, em São Paulo. Depois da sessão, íamos comer um pedaço de pizza na panificadora Santa Teresinha, na praça João Mendes. Até hoje é muito bom. E de doce havia uma novidade chamada Dantop.
Meu pai tinha um gosto cinematográfico completamente sofisticado. Ele defendia que Massaki Kobayashi era um diretor melhor que o Akira Kurosawa. Conversávamos o tempo todo sobre cinema em casa, e depois, já adulta, estudando a época de ouro do cinema japonês, percebi que eles tinham toda a razão. Tinham um gosto refinado que batia com a crítica. Isso é muito gozado, nunca vi gente próxima a nós discutir os filmes do jeito como se discutia em casa. Para todo mundo era mero entretenimento, para o meu pai era arte. De algum modo isso ficou comigo.
Minha primeira investida no mundo foi pela escola, entrei de cabeça. Eu sou a caçula. Na família tradicional japonesa – e isso se traduziu em casa – o primogênito é o top, é quem vai continuar o nome da família. E homem. As mulheres, digamos assim, têm papel de coadjuvante. Então sim, durante algum tempo, meu irmão mais velho teve um tratamento que nós achávamos um pouco privilegiado.
Minha irmã mais velha ajudava minha mãe a cuidar da casa, a do meio tinha grande talento para a dança, e a mim restava estudar. Mas ao longo do tempo tudo acabou se emaranhando, minha irmã mais velha fez faculdade de Ciências Sociais, enfim, as coisas não ficaram tão estanques como o modelo fazia prever.
Entrei na ECA-USP [Escola de Comunicação de Artes da Universidade de São Paulo] para fazer jornalismo, mas com a experiência de uma infância inteira vendo filmes, fiz inscrição para Cinema. Nunca ninguém da minha família questionou, eles não tinham esse grau de intervenção. Essa liberdade na escolha profissional representa um salto que talvez o pessoal da terceira geração não tenha idéia do que seja. Para minha mãe, por exemplo, poder escolher seu trabalho seria impensável.
Depoimento ao jornalista Leo Nishihata
Fotos: Carlos Villalba e arquivo pessoal de Olga Futemma
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil