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A rotina aqui era absolutamente massacrante. Meus pais acordavam às 2h da manhã, iam para o Mercado Municipal descarregar os caminhões e às 4h preparavam os tablados. Lá pelas 5h, chegavam os clientes feirantes. Das 7h até o meio-dia, vinham os particulares. Voltavam para casa, almoçavam, dormiam um pouco e às 17h iam para o Ceasa fazer compras para o dia seguinte. Nunca dormiam 8 horas seguidas, e levaram essa vida por mais de 30 anos.
Havia todo um grupo de okinawanos trabalhando no Mercadão. Isso formou um sentimento de comunidade muito forte. Vivia entre aquelas senhoras, e não me lembro de uma experiência tão gentil e doce, dá muita saudade. Okinawa é um arquipélago separado, com dialeto diferente. A cultura é uma mistura de influências: Japão, Coréia, China, Micronésia.
Durante muito tempo, os okinawanos foram um terceiro elemento, à parte dos japoneses, apesar do brasileiro não distinguir um do outro. Podemos falar em termos de preconceito, como sempre existe quando há subgrupos. Mesmo no Kasato Maru, havia grande porcentagem de okinawanos. Trata-se de uma província mais pobre, e as levas migratórias tradicionalmente começam pelas populações mais pobres.
Ao mesmo tempo, um traço cultural muito forte dessa comunidade é a sua extrema musicalidade. Meu avô praticava canto clássico, meu tio também, meu pai tocava taiko, minha irmã desde os quatro anos é uma grande dançarina de bailado clássico okinawano. Todos os senhores do mercado se reuniam sábado e domingo na casa do meu avô para ensaiar canto, aquilo ressoava pela casa toda.
Os grupos de okinawanos da Vila Prudente, Vila Carrão e Casa Verde [bairros de São Paulo] eram muito nítidos, havia certa rivalidade nos festivais de dança, cada professor tinha um estilo. As mulheres tocavam koto, os homens shamisen, e isso ia temperando a vida, dava calor a essa rotina massacrante.
Depoimento ao jornalista Leo Nishihata
Fotos: Carlos Villalba e arquivo pessoal de Olga Futemma
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil