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Katian akette!''
(Teruaki Sato)
'Katian akette! Katian akette!' (Mãe, abre a porta!) foram as palavras que ecoaram em uma noite escura, próximo a linha da estação ferroviária da cidade de Suzano em 1951.
A potência da voz destas palavras era um estrondo que ia acordando os pacatos suzanenses que dormiam em suas residências.
Remontando os acontecimentos daquele mesmo dia, Papai foi ao grupo escolar de Suzano em seu segundo ano do primário. Em meio as matérias que a professora escrevia no quadro negro, estava a lembrança que lhe chamou a atenção, ao passar em frente ao Cine Suzano (o primeiro cinema da cidade, anterior ao Cine Saci). Papai viu um cartaz com um gorila gigante em cima de um prédio caçando teco teco que sobrevoava sobre a sua cabeça.
Assim, as 20hs da noite, Papai se encaminhou sozinho a Rua Benjamin Constant, uma da únicas ruas cobertas de paralelepípedo na cidade na época, próximo a praça da Igreja, onde se localizava o cinema. No caminho Papai já visualizava sua mãe movimentando a cabeça com um não junto a uma bronca caso Papai fizesse uma simples pergunta, 'Posso ir ao cinema?'. Por este motivo Pá preferiu se conter ao invés de saber a resposta de Obá.
Já em frente ao Cine Suzano, tamanha era sua vontade de assistir o filme, que Papai num ímpeto foi se adentrando a sala de cinema.
Papai entrou na sala de piso de madeira, sentou na poltrona dura e se encantou com a tela de tecido esticado que projetava imagens. Do fundo da sala escura se via um furinho, local que partia a luz em direção a tela e que proporcionava o sorriso em seu rosto.
O filme em cartaz na semana era o clássico King Kong, naquela época o filme já era considerado um clássico, o filme data de 1933, época de seu lançamento.
Papai assistiu encantado a história do gorila gigante que tentava retornar ao seu lar em meio a arranha céus de Nova Iorque. Era um mergulho nas cenas em preto e branco, os efeitos especiais garantiam o assombro dos poucos espectadores que se encontravam na sala.
Após o letreiro subir e a tela do cinema ficar escura, Papai retornou feliz da vida para casa. Tinha ainda em mente os movimentos e feições do gorila.
As ruas da cidade sem o pó habitual que subia dos movimentos de carroça e carro de boi e com os pontos claros sobre postes de iluminação, Pá caminhou para a sua casa que se localizava do outro lado da linha de trem.
Chegando em frente a sua casa, entrou na varanda e para sua surpresa Papai se deparou com a porta fechada. Assim, num ato de desespero Papai começou a se entristecer e chorar. Lágrimas corriam pelo seu rosto. Seu choro que gradativamente foi aumentando começava a causar um zum zum na rua silenciosa.
Obá sabendo que seu filho mais velho tinha sumido e não deu satisfação, bateu o pé e garantiu para si mesma que não cederia aos caprichos do pequeno Terubô (como Obá o chamava), mesmo que toda a vizinhança descobrisse que ali, bem diante da porta de sua casa havia uma mãe que deixou seu filho do lado de fora.
Pouco a pouco as luzes de casas vizinhas foram se acendendo e o grito que quase acordou uma cidade, venceu.
Assim, Obá num movimento rápido de abrir e fechar a porta puxou Papai para dentro do lar.
Apesar do desfecho, Papai dormiu com um sorriso em seu rosto. Foi uma noite de glória para um garoto de 9 anos.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil