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Aruku diki ga kittara, aruku!''
(Arata Sato)
Meu avô ou Odi como carinhosamente costumávamos chamá-lo nasceu em uma região longínqua, fria e montanhosa de uma pequena cidade chamada Tajima, região de Aizu, Fukushima, norte do Japão.
Era o terceiro filho e o único dos irmãos que conseguiu estudar e se formar em colégio técnico; na época privilégio para poucos.
No dia 30 de janeiro de 1934, aos 18 anos de idade, contra a vontade de sua mãe e junto com mais dois amigos embarcou para uma terra desconhecida do outro lado do mundo chamado Brasil.
Foram semanas a bordo do navio Africa-Maru, mirando a linha tênue que separa o horizonte azul do mar e do céu. Finalmente, Odi desembarcou no porto de Santos no dia 27 de março, e foi para o norte do país, na cidade de Tomé Açú no Pará. A cidade era conhecida como a Cidade da Pimenta, principal atividade econômica na época e trabalhou na implementação do cultivo da pimenta do reino.
Anos mais tarde, percorreu o país até se estabelecer em Suzano na grande São Paulo, cidade que 'Shin san' como era chamado Odi, conheceu a sua futura esposa Wakako Seichi. Meu pai Teruaki o primogênito nasceu em 1942.
Na cidade, no bairro de Ipelândia ou 'Fukuhaku' para a colônia, Odi foi professor de língua japonesa para crianças e judô nos anos da segunda guerra, época que falar japonês e lecionar a língua era considerado crime. Minha avó ou Obá viu Odi ser preso e mais tarde torturado pelo fato de ser professor.
Passaram se os anos, e agora estabelecidos no centro de Suzano com uma atividade nova, tinturaria, Odi e Obá criaram seus quatro filhos: Michiko, Papai, Yoko e Massaaki. Todos ajudaram na tinturaria em uma época difícil. Papai foi para São Paulo estudar e se graduou em Engenharia pela FEI. Época que conheceu mamãe, Amelia Harue Yamamoto.
Eles casaram em 1970 e deram a luz anos mais tarde a um casal de gêmeos, eu e Naomi. Crescemos visitando os avós nos finais de semana.
Odi não era muito de conversa, suas poucas palavras que quebravam o silêncio espalhavam sabedoria e afeto, até mesmo com o olhar. Perguntávamos para Odi sobre o passado e a resposta sempre era a mesma: 'esqueci', seguido com um sorriso. Para Odi como um preceito budista, o passado não tinha mais a sua importância, o futuro era uma incógnita e o momento mais importante e precioso era o presente.
Certa vez Odi proferiu: 'Aruku diki ga kittara, aruku!' palavras que significam: 'Quando despertar a vontade de andar, eu ando!' ao ser indagado o motivo de não retomar a caminhada após um período acamado. E assim em uma tarde fria de junho de 2003, Odi partiu, caminhando e levando consigo toda a história de uma vida, sabedoria e sorriso sereno que ele espalhava por onde passava.
Com um ponto de interrogação de tantas perguntas no ar que não foram respondidas, voltei ao Japão com a missão de resgatar a história da família Sato.
Morando em Tóquio, juntamente com minha irmã Naomi e com a ajuda de Kanno san, um 'Obõsan' (monge budista) que reside na mesma província que Odi nasceu, conheci as raízes.
Este dia, tive o privilégio de encontrar e conhecer o último irmão vivo do Odi, Tomeyoshi san. Na visita a sua casa, tive a sensação que ele estava nos aguardando. Nos apresentamos, conversamos e ele escreveu em um pequeno pedaço de papel o endereço na qual gerações da Família Sato descansam. Fizemos a visita a este local, em uma região montanhosa, e emocionados, oramos e agradecemos.
Foi a primeira e a única vez que tive contato com o meu Tio Avô. Mas parecia que nos conhecíamos há séculos. Era o resgate de uma laço famíliar que havia se perdido.
No alto da montanha, conhecendo as raízes, senti a presença de Odi.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil