Conte sua história › Marcelo Norio Inada › Minha história
Minha mãe diz que demorei para começar a falar. Tentava me alfabetizar em japonês; porém quando tentou o português, comecei a tagarelar! A vizinha até perguntou se havia outra criança em casa!
Iniciei meus estudos na escola brasileira e concomitante na escola japonesa. Achava normal, até que um dia um colega veio tirar um barato: “Japonês, calabrês, come sapo todo mês!”. Quem é o descendente que nunca ouviu isso? Até então, não sabia o que significava ser japonês sendo brasileiro... O que ele não sabia, é que eu tenho sangue de samurai e, na época, assistia muito o incrível Hulk. Minha mãe, com intenção de não ser superprotetora e querendo me ensinar a me defender sozinho, dizia que não era para começar nenhuma briga, mas que também não era para vir chorando para casa porque apanhou, ou apanharia duas vezes; o enxerido aprendeu a nunca mais mexer com um “japa”! Acertei-lhe um soco bem no meio do nariz! E fui parar na diretoria... Aprendi então que eu era diferente aqui no Brasil. Eu era um japonês!
Quando pequeno não gostei de ser chamado de japonês! Mas hoje tenho muito orgulho de ser descendente deste povo, de quem tenho certeza de que herdei muitas características, não só físicas, mas alguns costumes também! Sempre que tenho algum problema ou algum obstáculo na vida, lembro o que minha mãe sempre disse: vocês têm exemplos de garra, tenacidade, perseverança, espírito de guerreiro e vencedores na família. Espelhem-se em seus avós e bisavós, que vieram novos, com idades entre 9 a 11 anos, sem os pais, somente com os tios, apenas com algumas roupas e outros pertences. Vieram para um país desconhecido, sem ao menos saberem falar a língua, com costumes completamente diferentes, sem amigos, do outro lado do planeta! Vieram em busca de novas oportunidades, para enriquecerem, vencerem na vida e voltarem para o Japão... Venceram! Mas não voltaram... ou eu não estaria aqui escrevendo...
Sou filho de pai e mãe brasileiros, mas filhos de japoneses (nisseis). Criado em Araçatuba, interior de São Paulo, a 540 km da capital. Araçatuba é uma região onde a concentração de famílias japonesas é grande, devido à lavoura de café, no início do século passado. Mantém muito a tradição japonesa, com igrejas budistas, associação cultural nipo-brasileira onde são realizadas cerimônias de chá, ikebana, danças típicas e aulas de língua japonesa, entre outras. Freqüentei escola japonesa, joguei beisebol, participei de concursos de karaokê, udons, undokais, e bon-odoris. Costumes que existem até hoje, com a participação de jovens sanseis e yonseis.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil