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Obs: Tomoo Handa, pintor e escritor é autor de, O imigrante japonês, uma das referências fundamentais para conhecer a saga de milhares de japoneses que aqui aportaram e deixaram seus filhos, netos, bisnetos e agora começam a nascer os trinetos.
A partir da pág. 281 até 297, temos o capítulo. “Os órgãos administrativos e a educação nos núcleos de colonização” onde ele descreve a escola japonesa construída e dirigida pelos imigrantes. A seguir reproduzo o trechos do livro que avalio serem mais interessantes no sentido acrescentar o que escrevi.
Este livro esta esgotado, então uma alternativa é recorrer ao artigo da Prof. Zélia Brito Fabri Demartini depositado no sítio Discovernikkei, em pdf, mantido pela Japan American National Museum (http://www.discovernikkei.org/wiki/index.php/Education).
...............Do livro de Tomoo Handa
Passo agora ao problema da escola e educação
Antes de mais nada, os japoneses construíam a escola” – essa era a fama. Mas que tipo de escola ?
Em primeiro lugar, era preciso que não se exigisse muito dinheiro. Conforme o caso servia qualquer casa de pau-a-pique. As paredes podiam ser de barro, e cobertura de sapé. Se o número de alunos fosse pequeno, a casa particular também servia. Não importava onde funcionasse – era melhor improvisar do que não ter, eis o pensamento que os norteava.
Imagine-se que num núcleo de 20 ou 30 famílias se tenha decidido construir uma escola. A totalidade das famílias (isto é, só homens ou, conforme a família, só seu chefe; às vezes também participam moços), aproveitando feriados ou domingos, constrói uma casa de um cômodo apenas.
Como arranjar terreno ? A solução consistia em obter autorização para uso temporário de lote pertencente a algum colono ou receber como doação um terreno. (Conforme o núcleo, o local já teria sido reservado quando do início da venda dos lotes.) Mesmo que se recebesse uma doação, como eram poucas associações de japoneses registradas como pessoas jurídicas, em muitos casos não se conseguia obter o título de propriedade. Por isso, o comum era a autorização de uso mediante pagamento de algum aluguel.
Muito bem. Definido o local, o que exigia dinheiro eram as telhas, as quais não se conseguiam obter de graça. E na falta de dinheiro a solução seria a cobertura de sapé. Mas então a escola iria parecer miserável demais, e diante dessa consideração todos faziam um esforço, contribuindo cada casa com 5 ou 10 mil-reis. Na época, tratava-se de despesa pesada, mas .... que fazer ? Uma escola construída desta maneira dava a impressão de que ficava lotada com 20 ou 30 alunos em seu interior. Se por acaso optasse por uma construção de 5 por 10 metros, para permitir a realização de assembléias de associações de japoneses ou festejos do núcleo, o que aumentava eram as despesas com telhas.
Inicialmente, eram mobilizados os que entendiam de carpintaria. Em qualquer núcleo sempre havia uma ou outra pessoa que preenchia esse requisito. Mostrado o projeto, juntava-se a madeira necessária. Com a participação de moços, ia-se buscar madeira no local em desbravamento mais próximo. A madeira era obtida sem nenhum pagamento, e transporte se fazia sobre os ombros de muitas pessoas. Assim ficava pronta a estrutura. Casos havia em que a associação dos japoneses enviava algum dinheiro ao carpinteiro em “sinal de gratidão” mas, se acontecia de ter ele um filho em idade escolar, era comum recusar o pagamento. Nessas condições se resolvia, na festa de conclusão do vigamento do telhado, comprar um pouco mais de pinga e caprichar nas iguarias.
A colocação de telhas e aplicação de barro nas paredes eram trabalhos feitos com a convocação da totalidade dos participantes da construção. As ripas, feitas com os coqueiros cortados ao meio, são dispostas em pé, para em seguida receberam lateralmente, no sentido horizontal, paus finos que lhes são atados com cipó. À maneira japonesa, ao barro são adicionados palha e sapé picados. Duas aplicações da mistura bem amassada são feitas nas paredes, tanto interna como externamente: não se rebocavam as paredes.
Naturalmente, não se fazia o forro, e o chão era batido para ficar bem duro. Se se tratasse de casinha, abriam duas janelas de cada lado, ou distribuídas em três lados. Se a escola fosse grande, eram necessárias de 6 a 8 janelas para se conseguir claridade suficiente. No caso de barraco de pau-a-pique eram inconveniente as janelas grandes, e por isso se aumentava o número de aberturas. Se se achasse pouco prático a janela, ou porque ela entrasse água da chuva ou porque os raios de sol fossem fortes, colocavam-se dobradiças na parte de cima e mantinha-se a janela levantada com um pau. Era o sistema mais indicado para cortar o sol e a chuva numa época que não havia vidro. As “carteiras” eram improvisadas com uma tábua pregada sobre os paus fincados no chão. Os bancos, precisando ser móveis, eram feitos apenas com tábuas. Demandavam algum dinheiro. Acrescentem-se o quadro negro, a mesa e a cadeira do professor. Ainda não havia estrado reservado para a mesa do professor.
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Como funcionava a escola
Conforme a localidade, pedia-se ao professor que lecionasse só no período da manhã, e que à tarde trabalhasse na lavoura. O professor também tinha família, e se dispusesse de um terreno seus familiares podiam utilizá-lo para algumas culturas. Como não se podia exigir pagamento, o núcleo alugava o terreno de alguém e o cedia graciosamente ao professor. Na semeadura ou na colheita, mobilizava-se a moçada para ajudá-lo. Como compensação, podia-se pedir-lhe que desse aos ajudantes algumas aulas noturnas por semana. As coisas eram assim encaminhadas .
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Em núcleos pequenos havia pouco mais de dez alunos; se houvesse cerca de 50, então se tratava de núcleo com perto de 100 famílias. Ainda era uma época em que havia poucas crianças3. Até 20 alunos as aulas eram ministradas em conjunto. Quando se passou a contar com professor de português, suas aulas eram dadas pela manhã, ficando o japonês para o período da tarde. Enquanto se mandava a metade da classe copiar a lição ou fazer exercícios livres, à outra metade se ensinava leitura. Mesmo com relação à aritmética, a uma ala dava-se a resolução de problemas e a outra fazia-se decorar a tabuada. Como essa época os caracteres kanji de jornais e revistas eram ladeados de furigana, que indicavam a sua pronúncia, quem de alguma forma conseguisse ler livros e fazer as quatro operações aritméticas era tido na melhor conta. Sendo núcleo de japoneses, imaginava-se que o aprendizado da conversação era feito naturalmente........
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Neste estilo as aulas matutinas, com cerca de duas horas de duração, chegavam ao fim – e depois havia as da tarde. Mas, quando os alunos eram poucos as aulas chegavam a mais ou menos três horas de duração. Nessas ocasiões os alunos levavam merenda.
O almoço era às 10 horas, mais ou menos, e em seguida se descansava cerca de uma hora. A merenda dos alunos consistia em marmitas do tipo japonês com bolinhos de arroz acompanhados de sardinhas salgadas grelhadas, bolinhos de arroz temperados com sal e gergelim e conservas de mamão em misso. Havia quem levasse como lanche bolinhos de farinha de trigo fritos. Tais bolinhos eram enrolados em folha de bananeira e envoltos num lenço. Como não possuíam maletas, enfiavam em sacolas – que traziam a tiracolo – o livro escolar, o caderno e, no caso de alunos de séries inferiores, o sekiban (lousa de pedra) e o sekihitsu(giz de pedra). Todos descalços. Os meninos usavam bonés brancos feitos em casa, parecidos com os atuais chapéus de alpinistas. Havia meninas que usavam lenços. Todo mundo corria saltitando para casa. O linguajar usual dos meninos era uma mistura de português aprendido na fazenda e do japonês dialetal que os país falavam em família.
............. aqui interrompemos a descrição de Tomoo Handa
Seria interessante que houvessem testemunhas destas descrições, lembrem-se que estas escolas foram fechadas quando da entrada do Brasil na segunda guerra mundial, portanto muitos ex-alunos ainda estão vivos. É importante aproveitar o momento para resgatar estes momentos e usarmos para o presente.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil