Conte sua história › Naomi Munakata › Minha história
A gente aqui reclama da vida dura, mas vocês não sabem o que é viver no Japão. Como diz meu pai: a gente nunca sofreu de verdade no Brasil. Ele, que participou da Segunda Guerra Mundial, sempre dizia: a gente ganhava uma batata por dia e às vezes comia crua, porque não tinha como cozinhar.
No Brasil, tudo é muito farto. Ao contrário do Japão, onde até hoje se come muito pouco. Eles não enchem a barriga como a gente enche. Imagina se eles deixam alguma coisa estragar lá! Mesmo com todos os problemas, eu sempre gostei mais do Brasil. Aqui ainda existe a possibilidade de crescer. A gente não dá valor ao que tem aqui.
Eu me sinto aquela japonesa cujo coração é brasileiro, sabe? Na disciplina, por exemplo, eu sou muito nipônica. Meu coro nunca começa depois das 9 horas. Tenho também aquela coisa de respeitar as hierarquias, especialmente quando tem japonês na minha frente. Eu sou daquelas que engole sapo e acaba abaixando a cabeça. Acontece com o Teruo Yoshida, regente do coro infantil da Osesp [Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo], que foi meu professor e hoje é meu subalterno. Ele é muito japa: manda mulher carregar um monte de partitura e não quer saber. A gente fala em japonês, mas eu só consigo dar bronca nele em português. O excesso de respeito me impede de chamar a atenção dele em japonês. Minha secretária diz: “Quando a Naomi começa a falar em português com o Teruo, é porque o negócio tá bravo!”
Eu gosto do Brasil porque aqui ninguém te cobra. Eu adoro isso. As pessoas aqui têm uma certa liberdade. Você pode fazer o que quiser e do jeito que você quiser. Não tem aquele policiamento que tem no Japão. Mas, por outro lado, entrar no trem na hora certa, como acontece no Japão, eu acho maravilhoso. Às 8h02 o trem fecha a porta e ninguém mais entra. Aqui já seria às 8h03, 8h04... Ainda bem que eu trabalho num lugar onde existe um certo rigor...
Depoimento ao jornalista Xavier Bartaburu
Fotos: Carlos Villalba e arquivo pessoal de Naomi Munakata
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil