Conte sua história › Fernanda Takai › Minha história
As pessoas me perguntavam qual é a diferença de ter avós japoneses. Eu dizia que, antes de serem meus avós japoneses, eles eram meus avós paternos simplesmente. Claro que quando eu passava um tempo na casa deles, tinha uma aura toda diferente, de comida, de decoração da casa, de hábitos, do banho do ofurô, mas isso para mim era tão normal. Boa parte das minhas férias eu passava em São José dos Campos (SP) com meus avós. Lá eu fazia um mergulho neste universo deles. Só com o tempo eu percebi que eu convivi muito com a minha família japonesa e fui assimilando e, ao mesmo tempo, achando isso tranqüilo e natural, como é no Brasil essa mistura das raças.
Era só estar de férias para todo mundo ir para a casa dos meus avós. Tinha todo um ritual, de acordar, tomar café todo mundo junto, fazer comida, acompanhar os avós no mercado, ajudar a picar verdurinhas (ouça o áudio em que Fernanda conta mais detalhes sobre as suas férias).
Os meus avós eram muito carinhosos com os netos. Quando eles sabiam que a gente ia chegar, só faziam as comidas que a gente gostava, comidas japonesas! Eu adorava sukiyaki, meu avô sempre fazia para mim. E a minha avozinha também separava o travesseirinho da cor que eu gostava, tudo bonito, cheiroso.
Em todo lugar que os meus pais moraram, seja na Bahia ou em Minas Gerais, a gente nunca tinha parentes por perto. Então, quando havia oportunidade de ver todos os primos, os tios e os avós, era tão bom, dava uma sensação de aconchego, vontade de fortalecer esses laços.
Por muitas vezes, a gente passou o Natal e o Ano Novo na casa dos meus avós. Era tradicional a gente comer lá, no primeiro dia do ano, o moti, um bolinho para grudar felicidade. Todo mundo comia moti, que é feito de arroz com shoyu. Tinha gente que gostava em sopa e tinha gente que gostava frito, e minha avó fazia os dois. Eu me lembro de todo mundo sentado à mesa, os mais pequenininhos e os mais velhos, todo mundo comendo moti para grudar felicidade. Achava bonitinho. É uma coisa que toda família japonesa faz, tem até uma cerimônia antes de pegar o bastão e amassar com o pilão. É bem simbólico. Eu, quando eu era pequena, já pegava amassadinho, já chegava para comer.
Apesar das tradições, como as festas de final de ano, meus avós não traziam muitas memórias do Japão, porque eles saíram de lá muito novos. Por mais que eles morassem na colônia e tivessem o convívio do idioma, eles tentavam muito falar o português com a gente. Eles sabiam que estavam no Brasil, país que tinha os acolhidos de uma forma tão bacana.
Até hoje, quando eu vou a São Paulo, o que me vem à cabeça são todas aquelas férias que eu passava com meus avós. Eu gostava muito daquele ambiente japonês. Meu avô morreu há poucos anos, minha avó continua viva e sempre vou visitá-la. Se eu tenho um compromisso em São Paulo, alugo um carro ou vou com minha prima a São José dos Campos.
Eu escrevi a história dos meus avós em um dos capítulos do meu livro Nunca Subestime uma Mulherzinha (Panda Books, 2007: https://pandabooks.websiteseguro.com/livros.php?id=229).
Depoimento à jornalista Sílvia Amélia de Araújo
Fotos: Eugênio Sávio e arquivo pessoal de Fernanda Takai
Vídeos e áudios: Estilingue Filmes
As férias de infância na casa dos avós japoneses
30.000 Pés (Fernanda Takai/John Ulhoa). Disco: Daqui Pro Futuro. Selo: Rotomusic/Tratore
Mamã Papá (Fernanda Takai/John Ulhoa/Rubinho Troll). Disco: Daqui Pro Futuro. Selo: Rotomusic/Tratore
Vagalume (Fernanda Takai/John Ulhoa). Disco: Daqui Pro Futuro. Selo: Rotomusic/Tratore
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil