Conte sua história › Ken Yamazato › Minha história
A história da família Yamazato no Brasil teve início oficialmente com a chegada de meu avô Chizu Yamazato, 48 anos, e seu filho mais velho, Chimo, 21 anos, ao porto de Santos, em setembro de 1921. Chizu já havia estado clandestinamente no Brasil em junho de 1910. Ele fez essa viagem oculta porque, como na primeira leva os imigrantes okinawanos fugiram das fazendas contratantes, foi vetada a saída de elementos dessa procedência.
A família Yamazato tem sua raiz na família Uezu, uma das famílias mais tradicionais da Ilha de Kumejima, Okinawa, Japão. Os ancestrais descendem da Primeira Dinastia Chuzan, fundada pelo rei Sho Hashi, que unificou Okinawa, lá pelos anos de 1470. A mansão dos Uezu fica em Nishime e ocupa uma área de 1.101 metros quadrados, cuja construção edificada em 1726 foi tombada como patrimônio histórico do Japão.
Meu pai, Chisai, então com 19 anos, chegou ao porto de Santos em maio de 1926, juntamente com sua mãe, Kame, sua irmã Ushi e seu irmão caçula Chiei. Em Santos, onde o meu avô tinha um armazém de secos e molhados, se estabeleceram.
Minha mãe, Moushi, então com 21 anos, da tradicional família Hanashiro, também de Kumejima, Okinawa, chegou ao Brasil em 1932, casada com papai por apresentação/procuração dos meus tios Hanashiro.
Além do comércio em Santos, a família tinha uma plantação de bananeiras na região de Juquiá. Em 1934 nasceu em Santos minha irmã mais velha, Satico. De Santos a família mudou-se para a zona rural de Mogi das Cruzes, onde nasceram os três filhos homens: Kazuo (1936), Ken (1939) e Tomosaburo (1941).
Em seguida, os meus pais compraram um sítio (mata virgem) de 5 alqueires no bairro S. João das Palmeiras, no então distrito (hoje município) de Suzano. Em 1943 nasceu Miyoko, a irmã caçula da família. Augusto Shigueru Yamazato, filho de Chimo Yamazato, sempre conviveu conosco, sendo considerado como um irmão mais velho; estudou teologia no Japão, é professor, escritor e autor dos livros “A História Ilustrada do Japão” e “Os Sete Dekasseguis”, entre outros.
Foi talvez a fase mais difícil e atribulada, pois, além da parte física de desbravar matas, abrir picadas e estradas, construir casas de pau-a-pique, barracões, poços etc., estava em pleno curso a II Guerra Mundial, onde os japoneses, juntamente com alemães e italianos, eram considerados “inimigos da pátria”. A comunidade japonesa na região já era bem numerosa, o que ajudou a minimizar os problemas e o sofrimento. A guerra terminou em 1945, mas os problemas da comunidade japonesa continuaram ainda por muitos anos.
Em 1946, com 7 anos, era tempo de começar a freqüentar a escola primária, que ficava a cerca de 3 km de distância. Meus irmãos e eu caminhávamos diariamente cerca de 6 km para estudar, pois não havia outra maneira de se locomover. Como a prioridade absoluta da colônia japonesa era a educação, no início de 1947, papai comprou uma casa com um grande quintal, no centro de Suzano, e para lá mudamos, com toda a família, para facilitar os nossos estudos. O sacrifício maior ficou com papai, que, morando no centro cidade, tinha que tocar a lavoura em Palmeiras, a cerca de 10 km de distância. Inicialmente viajava de jardineira (uma espécie de ônibus rudimentar). Posteriormente, num ano de boa safra, conseguiu comprar um caminhão de segunda mão, o que facilitou muito sua locomoção.
Mas, sendo a agricultura familiar muito irregular e instável, nos anos seguintes, à medida que as despesas de manutenção da família aumentavam, papai foi obrigado a vender o caminhão e o sítio de Palmeiras, para que pudéssemos continuar os nossos estudos. Daí para frente ele sempre cultivou terras em áreas arrendadas na Zona da Mata mineira. Mamãe ia esporadicamente ao seu encontro, mas sua prioridade era a educação, a alimentação e a saúde dos filhos. Nós íamos ajudá-lo, quando possível, nas férias escolares.
E assim, nesse ritmo, de incrível esforço do papai, de dedicação da mamãe e de compreensão das irmãs, conseguimos os filhos homens nos formar em engenharia: Kazuo, em engenharia mecânica pela USP-S. Carlos, eu, em engenharia industrial mecânica pela FEI-PUC-SP, e Tomo, em engenharia metalúrgica pela UFF (Volta Redonda - RJ). Tomo fez ainda mestrado na UFRJ, foi bolsista do governo federal na Alemanha (Programa Nuclear) e foi professor de pós-graduação em metalurgia na UFMG, em Belo Horizonte.
Satico se casou após terminar o colegial e nos ajudou na nossa formação. Em 1971 casei-me com Elena Terumi Ogassawara, de Assaí (PR), mãe de nossos dois filhos: Elke e Erik, ambos engenheiros formados pela Escola Politécnica da USP. Miyoko interrompeu os estudos por cinco anos, após o colegial, para nos ajudar a concluir os estudos. Ao retomar os estudos, ingressou na Faculdade de Letras da USP, onde se licenciou em Português. Foi professora municipal e se aposentou no início de 2005. Sempre morou com os pais, dos quais cuidou de maneira ímpar, até o fim de suas vidas: mamãe em junho de 2005, com 94 anos, e papai em novembro de 2006, com 99,5 anos.
Meus pais não deixaram nenhum bem material para nós, mas sim o maior tesouro que os pais poderiam nos legar, como: fé, ética, solidariedade, esperança, amizade, paciência e muito amor.
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil