Conte sua história › Eiko Harada › Minha história
Nasci em Nagasaki, no Japão, em 3 de outubro de 1954. Tenho algumas lembranças daquela época, como as brincadeiras na neve com meu irmão, Kazutoshi Harada.
Vim com meus pais para o Brasil quando tinha 6 anos, pois a situação econômica no Japão estava ruim. Em 1960, eles vieram trabalhar nos cafezais, na cidade de Centenário do Sul, no Paraná.
Três anos depois, nos mudamos para Londrina (PR), para trabalhar no cultivo de uva itália. Nossa família era bem unida. A educação, muito rígida: eu não podia falar português em casa, nem ter amigos brasileiros. Meu pai dizia “que não aprendia coisa boa”. Eu era contra isso, chorava.
Na escola brasileira, tive muita dificuldade, pois não sabia falar português. Tinha que fazer mímica para me comunicar. Mas os nisseis (brasileiros filhos de japoneses) me ajudavam e eu conseguia passar.
Dos 14 aos 20 anos de idade, morei em Sorocaba, em São Paulo. Minha família trabalhava no cultivo de rosas. Casei-me aos 21 anos e tive que me mudar para São Paulo, onde trabalhava meu marido. Trabalhei como garçonete por dois anos, num restaurante japonês no bairro da Liberdade, até que vieram os filhos. Tenho três: Hiromi, de 28 anos, Sayuri, de 25 anos, e Toshihiki, de 22 anos.
Sofri muito com meu marido, que me batia sempre. Eu não podia abrir a boca.
Mas continuava com ele por causa dos filhos. Muita gente dizia que eu devia denunciá-lo, mas os padrinhos insistiam que eu devia continuar com ele, que as coisas iam melhorar. Em casa, só falávamos em japonês, o que foi ruim para meus filhos, que tiveram dificuldades na escola.
Em 1983, descobri minha habilidade para a ikebana (arranjo de flores). Uma parente do meu marido que me ensinou. Até hoje faço questão de fazer pequenos arranjos para enfeitar o canto da sala.
Quando fiquei grávida do terceiro filho, Toshihiki, em 1985, vi que não podia mais agüentar meu marido. Então, o abandonei. Fuji para o Nordeste, com uma amiga. Morei na cidade de Paulo Afonso, na Bahia, por 6 meses.
Em 1992, voltei a trabalhar em São Paulo, como balconista e, depois, como recepcionista. Em 1994, resolvi ir para o Japão, trabalhar como dekassegui. Foi muito difícil para mim, sofri muito, pois tive que deixar meus filhos no Brasil. Trabalhei por dois anos numa fábrica de bentôs (marmitas), em Saitama. Mandava todo o dinheiro para o Brasil, para sustentar meus filhos. Aproveitei para visitar Nagasaki, a cidade onde nasci, foi muito emocionante.
Voltei para o Japão como dekassegui em 2000, desta vez com meus filhos Sayuri e Toshihiki. Com eles perto de mim, tudo ficou mais fácil. Eles se adaptaram bem e estão até hoje por lá. Meu irmão, Kazutoshi, também vive no Japão. Falo bastante com eles, por telefone.
Hoje trabalho como gerente da Choperia Liberdade. É puxado: trabalho das 19h às 5h e só descanso às segundas-feiras. O barulho estressa a gente. Mas eu gosto muito do que faço. Os clientes geralmente são muito carinhosos, me chamam de “Mama”. Recebemos todo tipo de gente aqui, até travestis. Japonês mesmo vem pouco, pois a casa é muito cheia.
Quando olho para trás, vejo que minha vida foi muito sofrida. Deveria ter me separado antes do meu marido, que me tratava muito mal. Mas, desde 2000, posso dizer que tudo melhorou. Nos meus dias de folga, vou cantar em outro karaokê perto daqui [Choperia Liberdade]. Hoje vivo sozinha e não preciso dar satisfação para ninguém. É bom ter essa sensação de liberdade.
Depoimento à jornalista Kátia Arima
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil