Conte sua história › Angela Hirata › Minha história
Meu pai procurava nos proporcionar brinquedos japoneses que não existiam aqui. Fazia gangorras, bonecas, carros e animais de madeira; tocava gaita; ensinava música e brincadeiras japonesas. Depois nos incentivou a fazer esportes. Ele lutava kendô e jogava beisebol. Eu aprendi natação, jogos livres, maratona, esgrima.
Fomos muito bem educados e tivemos bastante conforto. Todos os dias, às 20h, minha avó fazia questão de nos dar aula de japonês. Eu detestava porque isso prejudicava muito meu aprendizado do português. Mas me ajudou a entender a cultura japonesa. Aprendi a ler e escrever japonês por meio de mangás que meu pai importava para nós. Acho que me interessei bastante pela cultura japonesa porque não era uma exigência da família. Eles diziam que éramos brasileiros, deveríamos agir como tal, mas nunca esquecer de nossa origem. Isso é uma coisa que procuro passar muito sutilmente para meus filhos e, agora, para minha neta.
Há coisas muito marcantes na minha infância. Como no colégio havia muita discriminação, eu estudava para ser a primeira da classe. Assim as pessoas me respeitavam, dependiam do meu conhecimento. Tínhamos uma família muito numerosa – 13 irmãos, além de um tio e uma tia que moravam conosco. Nossa casa foi reconstruída quando eu tinha uns 7 anos de idade. Tinha dez dormitórios, uma copa com uma mesa enorme, uma dispensa que acomodava os sacos de açúcar de 60 quilos que meu pai comprava. Quando a situação começou a melhorar ele instalou luz elétrica na fazenda.
O ano novo era muito esperado. A festa durava três dias, com visitas de parentes e amigos. Mesa farta. As mulheres na cozinha fazendo assado e comida japonesa. Minha mãe fazia doces japoneses. No dia primeiro do ano, a colônia se reunia no clube da associação japonesa, cantava o hino nacional brasileiro e o japonês e fazia reverência ao imperador.
A escola que freqüentávamos ficava a uns quatro quilômetros da fazenda. Quem não tinha cavalo, que era o meio de transporte mais utilizado, ia a pé. Um fato inesquecível foi quando ganhei um cavalo vermelho. Chamava-se Soberbo. Ele me serviu por muitos anos.
Minha juventude foi muito intensa, freqüentei bailes, dancei muito twist, rock and roll, samba, bossa nova. Fui a festas e excursões. Meus tios mais jovens vinham nos buscar de caminhonete para irmos à matinê, mas sempre com os irmãos controlando nossa vida, o comprimento da saia, reclamando que o batom estava muito vermelho. O bom é que minha família nunca nos obrigou a casar com gente da colônia. Tanto que entre os Hirata há uma mistura incrível: espanhóis, italianos, portugueses. Meu ex-marido por acaso é descendente de japoneses.
Depoimento à jornalista Juliana Almeida
Fotos: Everton Ballardin e arquivo pessoal de Angela Hirata
Vídeos e áudios: Estilingue Filmes
"Meu avô sempre dizia que o Brasil era a nossa terra"
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil