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  Conte sua históriaLuciana Mayumi Ueda › Minha história

Luciana Mayumi Ueda

São Paulo / SP - Brasil
43 anos, estudante

Fuga da tradição


Nasci em uma família brasileira.
Pais brasileiros, avós calados.
Somente agora, vésperas do centenário, que fui saber do passado da família: meu avô foi preso durante o período da ditadura por ter matado um homem. Ele era da Shindo Renmei.
Não cheguei a conhecê-lo. Faleceu um mês após meu irmão ter nascido, em 1979. Eu nasci em 1981.
Mas por causa dele, a família passou por uma revolução.
O cara mais tradicionalista da família fez com que seus descendentes não tivessem tradição alguma.
Foi uma fuga. Vergonha.
Cresci sem falar japonês. Sem hábitos japoneses.
Ainda estou brigando comigo mesma para aprender a falar japonês... (Pretendo ir ao Japão algum dia).
É tão estranho ter os quatro avós japoneses e saber tão pouco da cultura.
É se olhar no espelho e não se reconhecer.
Estou tendo que aprender a minha própria história. Onde foram parar minhas raízes?
Não culpo minha família por esta atitude, mas é impossível de conviver com este vazio. É angustiante.


Enviada em: 14/12/2007 | Última modificação: 14/12/2007
 

 

Comentários

  1. Cleber Shiguero Ueda @ 7 Mar, 2008 : 17:41
    Olá Luciana! Tudo bem? Tb sou Ueda e neto de japoneses pela parte materna. As vezes tb sinto essa frustração, principalmente por nao saber a história de meus bizavós que ja se foram. Pelos menos tive a felicidade de conhecê-los e herdei como segundo nome, o nome dele. Gostaria de ter tido mais contato com a nossa cultura descendente. Um abraço.

  2. Carlos @ 3 Abr, 2009 : 17:10
    Ola Luciana. Eu vivo atualmente na Costa Rica e me deparei pela primeira vez esta semana com este site. Eu sou nissei com fortes tradições da cultura japonesa. Fiquei felississimo em saber que a geração sansei em diante tenha demonstrado este interesse pela cultura dos nossos antepassados. Eu me distanciei um pouco pela geografia pois aqui nao tiveram imigaração japonesa. Mas eu sempre estou estudando o idioma japones e procuro saber muito da cultura japonesa. Isto que voce falou sobre "vazio" expressa muito o sentimento da maioria que perdeu os costumes da tradição. Perde com isso o que se chama de autoestima. Eu costumo fazer uma comparação com os indigenas la de Londrina (os Kaigangues) e os da Costa Rica. Eu vejo neles um povo que se perdeu. Estão à deriva, sem motivação, infelizes por serem indios. Nos nikkeis seremos como eles se seguimos de geração em geração negando as nossas raizes. O negro no Brasil se tornou bem valorizado a partir do momento em que eles começaram a olhar para si e sentir orgulho de si. E, isto estamos perdendo com o tempo. Luciana só o fato de voce se preocupar com isso já demonstra que voce sabe o que é importante para a comunidade. Isto gostaria de mandar para voce Cleber. Um abraço a voces todos da comunidade.

  3. Silvio Sano @ 4 Abr, 2009 : 01:26
    Parabéns, Luciana, por sua franqueza e pelo reconhecimento de que se deva "dar um desconto" aos ancestrais por atitudes já passadas. Fique tranqüila, não se envergonhe por isso. Agora, se quiser saber mais a respeito tente mostrar aos que estão vivos e sabem do passado, que isso não precisa ser considerado uma mácula na família já que várias considerações relacionadas à época, às respectivas formações (história milenar de um povo que ficou fechado 2 séculos ao mundo ocidental e idolatrava seu imperador como se a um deus, etc.), à forma como vieram a esta terra estranha, etc, devem ser levadas em conta. Em minha família também teve um Shindo Renmei nesse nível, um tio-avô (leia no perfil de meu irmão Jorge Tsuneharu Sano), mas em contrapartida, o meu avô, discordando, até rompeu relações com ele. Ou seja, na mesma família, caminhos extremamente opostos. Mas tudo isso é bom fazer aflorar porque, como um desabafo, tira um peso da consciência e, além disso, traz-nos ensinamentos. No mínimo, para que não se repita. Por isso, considero que o governo japonês erra ao não contar nos livros didáticos os períodos imperialistas que adotaram contra China e Córeia e, bem como, das razões que levaram nossos ancestrais a virem para o Brasil, porque, além disso, a vinda deles aliviou o país de um grande peso a tal ponto que considero-os como parcela contribuinte da situação que ora usufruem no mundo. Sem contar que a partir daí, os próprios nativos japoneses passariam a respeitar um pouquinho mais os nossos dekasseguis. Né, não, Luciana? Resumindo: vá em frente e contemple-nos com mais histórias da família... da parte boa também, viu. Você vai ver, você vai descobrir muitas. Aquele abraço.

  4. Takeshi Misumi @ 9 Abr, 2009 : 13:04
    Luciana, ADMIRÁVEL o seu texto. ADMIRÁVEL que, com tão poucas palavras (cento e sessenta e seis) voce conseguiu elaborar um texto tão significativo, que nos faz refletir muito. Cada palavra provoca uma profunda reflexão. ADMIRÁVEL o tom poético do texto. Não me refiro a poesia com as rimas das palavras, mas com as rimas das idéias. Senão vejamos: 1 – “Fuga da tradição” ......”O cara mais tradicionalista da família fez com que seus descendentes não tivessem tradição alguma. Foi uma fuga. Vergonha”; 2 – “Pais brasileiros, avós calados.” ....... “Ele era da Shindo Renmei.”; 3 – “É se olhar no espelho e não se reconhecer.” ....... “Onde foram parar minhas raízes?” ; 4 – Conclusão: “...é impossível de conviver com este vazio. É angustiante.” ADMIRÁVEL como uma jovem sansei consiga alcançar o quanto significam a tradição, a cultura, os hábitos japoneses, a importância de nossas origens. O alcance de seu texto foi muito bem complementado com os excelentes comentários acima do Cleber Shiguero Ueda e do Carlos. O Carlos foi muito feliz na comparação dos descendentes nipônicos com os indígenas e negros. Os comentários do Sensei Silvio Sano enriquecem o alto teor do seu texto. A conscientização pelos descendentes é importantíssima não somente para a preservação da autoestima, como diz o Carlos, mas principalmente para podermos exercer na plenitude o nosso papel de agentes multiplicadores de tudo que há de positivo na milenar cultura japonesa. Quanto à atitude tomada pelo seu avô, cabem várias reflexões. A começar pela época e contexto em que os fatos ocorreram. Leve-se em conta a situação beligerante entre os países (Brasil versus Japão), as diferenças brutais dos idiomas, a tradição militar do Japão do início do século XX com as sucessivas vitórias em várias guerras. E, um dos fatores que considero preponderante: os meios de comunicação da época - poucos tinham acesso ao rádio, as dificuldades de circulação dos jornais em idioma japonês, tudo colaborando não só para o isolamento, mas também para a propagação de notícias falseadas. ADMIRÁVEL o seu texto, repito. Espero que continue escrevendo mais e mais, provocando questionamentos e reflexões. Com certeza isso motivará outras pessoas a resgatarem o passado, rememorando e homenageando nossos heróicos antepassados, e assim contribuindo positivamente para o desenvolvimento sadio da sociedade brasileira. PARABÉNS, Luciana!

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