Conte sua história › Ricardo Mizusaki Katayama › Minha história
Pois é, foi n´outro dia que me descobri japonês. Mais especificamente no ano passado. Comendo tradicional nishimê, o tal do cozido que a Gabi Yamaguchi descreveu tão bem aqui http://www.100anosjapaobrasil.com.br/blog_furikake/2008/01/09/nishime-para-crescer/ , mas distraidamente esqueceu de passar a receita.
Desde criança, fui um japonês paraguaio. Boliviano, na verdade.
Reza a lenda que, aos 4 anos, numa viagem pela América Latina, uma senhora la paiana (nativa de La Paz??) ficou me puxando, dizendo "dame este niño, damelo!", pois achava que minha mãe estava seqüestrando um jovenzito indígena. Estranhamente, esta é um das memórias mais antigas que tenho.
O tempo foi passando, e todos notavam que havia algo de errado comigo. Apesar dos olhos puxados, não comia peixe. A batian insistia, "come, come peixe, Rica! Peixe oishi, gostoso!", mas eu sequer suportava o cheiro.
Durante a escola, um aluno rebelde, que provocava os professores e organizava as ausências coletivas dos colegas. Fugia das turmas de japoneses, que tendiam a se aglomerar numa sindicância social inintendível.
Balada japa, never.
Meu pai tentava, sem sucesso, promover as filhas de amigos japoneses dele. Mas eu simplesmente não tinha o amor a raça!
Passei na faculdade de administração, e meus pais achavam que tinha tomado jeito. Larguei para fazer comunicação.
Morando nos EUA, a certeza de todos que eu era mexicano. As pessoas chegavam falando comigo em espanhol e ficavam ofendidos quando viam que respondia em inglês. A mesma certeza deles comecei a ter sobre achar que minha suposta mãe realmente me teria roubado daquela velha inca.
Eis que, um dia desses, vem à mesa de casa aquele velho cozido insosso, com legumes sem graça, servidos em nacos solitários, num caldo ralo e desinspirado, que definitivamente não combina com meu predileto arroz-feijão-farofa com paio.
Pois bem que, na primeira mordida, o contraste agridoce do dashi e o sabor amônico da vagem al dente. Na segunda, o outrora dispensável nabo carregou todo o sabor do caldo num sabor que preencheu o paladar. A cenoura deu sustância com seu amido denso e os shitakes, o sabor amadeirado de cogumelos. Mas foi com o conhaco, uma gelatina salgada feita por toda boa batian, que viajei pela minha infância.
Desde então, me sinto mais em casa!
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Este projeto tem a parceria da Associação para a Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil