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22 Out, 2008

Jornadas

Raquel Hoshino

Superagui: aventura com meus queridos amigos curitibanos

No jargão scout, jornada é uma caminhada longa (de 5, 10, 15 km ou mais). Durante uma jornada escoteira, você tem de carregar tudo aquilo que é de maior importância nas costas. Ou seja, existe um limite aí de coisas consideradas "importantes". A pegadinha número 2 diz respeito a alojamento e comida. Você tem de carregar em suas costas, a sua casa (barraca, fogareiro e saco de dormir) e todos os suprimentos para todos os dias em que durar a jornada. Dependendo da quilometragem, isso significa que não sobra muito espaço para roupas, secadores de cabelo, ursinhos de pelúcia, livros ou maquiagens. Também não se perde tempo em uma jornada. Dependendo do quão inóspito é o terreno, ou quão longe você está, é necessário andar X quilômetros em X horas, senão corre-se o risco de pegar uma maré alta, perder o ônibus de volta ou uma balsa.

Os piores momentos que passei em acampamentos foram durante jornadas. E os melhores também. Tirando o cansaço, as dores nas costas, nas pernas, a vontade de matar quem te enfiou naquela roubada, as jornadas são aqueles momentos em que realmente você tem contato consigo mesmo. Afinal, os cinco primeiros quilômetros são sempre fáceis. Todo mundo conversa com todo mundo, é divertido, é novidade. Depois do 6o ou 7o quilômetro, todo mundo começa a economizar palavras (para economizar água), já não há novidades no caminho, as mochilas começam a pesar, as pessoas ficam mais concentradas e, bem, daí para a frente, é você com você mesmo. Você pode estar cercado de companheiros de viagem mas, no fundo, no fundo, você está sozinho. E se você se odeia, meu amigo, é numa jornada que você vai perceber!  ;-)

Não só isso. Escoteiros que passam por jornadas se tornam mais conscientes deles mesmos. Tornam-se mais centrados. Aprendem o valor de um copo d'água gelado ou de um arroz com feijão. Aprendem a olhar para o céu e agradecer pela chuva ter finalmente parado ou por ela estar para acontecer (e refrescar os corpos cansados). Escoteiros que passam por jornadas também aprendem que aquilo que julgávamos tão essencial era, no fundo, um peso desnecessário. Você aprende a tornar-se mais enxuto, mais econômico. A extrair das dificuldades, uma piada, um sorriso. Aprende a levantar a própria moral, levantando a dos companheiros. E, ao final, você percebe que, quando volta para casa, sua alma está diferente.

Falo isso porque me lembrei de duas jornadas que fiz nos "últimos" tempos. A primeira foi há um ano, em Superagui, litoral sul de SP, na divisa com o Paraná. Fui com "minha" adorável tropinha de sêniores e guias de Curitiba (escoteiros de 15 a 18 anos, na foto acima). Foram mais de 35km caminhando na areia das praias, debaixo de um sol escaldante, no lugar mais deserto em que já estive. A segunda jornada foi este ano, da qual acabo de voltar.

Uma não poderia ser mais diferente da outra. Em Superagui, meu corpo foi levado ao limite. Não havia água ou comida (além do que havíamos levado) e também não havia uma alma a quem pudéssemos pedir ajuda. Nesta última viagem, eu não estava em um local deserto. Não estava sozinha. Havia água, comidas deliciosas e o máximo que tive de fazer foi pegar oito aviões e carregar uma "mochila de mão" pesadinha. Definitivamente, não caminhei 35 km em três dias. Mas certamente foi difícil voltar para casa.

Califórnia: queridos companheiros de minha última soul journey

Postado por Raquel Hoshino | 5 comentários

Comentários

  1. japa pobre @ 23 Out, 2008 : 02:17
    legal

  2. mailly nomura @ 10 Nov, 2008 : 13:24
    nossa,deve ter sido bem dificil,mas deve ter compensado,com as lembranças q vc irá levar pra vida toda XD

  3. Rahyssa @ 23 Nov, 2008 : 20:26
    Oi! Sabia que um dos teus textos caiu hoje como tema de uma redação na UNAMA? Uma faculdade de Belém. Foi um sobre quando você começou a caminhar e teve um baita calo. Pra falar a verdade, nem fiz a minha redação sobre esse tema, mas enfim, fiquei curiosa pra saber a autora. Parabéns pelos textos, são bem legais! O link da prova: http://www.unama.br/processoSeletivo/provasGabaritos/unificado/2009-1/PS_2009_I_prova.pdf

  4. Soraia @ 23 Nov, 2008 : 23:26
    Querida Raquel... sumida... andando pelo globo... Depois do BambooCamp visitei o Falcão duas vezes... Passei aqui para ter noticias suas... Superagui está na minha lista de lugares para conhecer... A familia do meu pai é do Paraná e minha tia mora no litoral, lá na cidade natal deles, Antonina... Ainda não consegui visitar este Parque... Pelo menos já fui na Ilha do Mel... e em Janeiro irei no meu primeiro Jamboree Nacional, me preparando para quem sabe um Jamboree Internacional... Gostei dos seus comentarios do encontro com si mesmo nas jornadas... Muito legal.. O mais proximo que cheguei foi caminhar metade do caminho em Ilha Bela indo pra Castelhanos... SAPS!! Abreijo, Soraia 266/SP GE MOREB

  5. SAF @ 3 Dez, 2008 : 03:07
    Muito bom mesmo !!! Temos que curtir o máximo que puder desta maravilhosa vida, por que o Tempo passa tão rápido, e tudo que fizermos fica na História... Todos nós temos uma História, mesmo sendo simples, mas, é a nossa História... Um Abraço !!!

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Perfil

Raquel Hoshino é mezzo japa, mezzo italiana. Jornalista, ariana e chefe escoteira, está atrás de seu "gene zen". Aquele pedacinho oriental perdido, suficiente para transformá-la numa pessoa iluminada e calma o suficiente para comer uma tigelinha de arroz, grão por grão, enquanto admira a paisagem de suas jornadas.
 


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