Eu estava preocupado com este blog no começo... Como vou falar sobre cultura pop japonesa sem explicar os elementos que a formam? São estes: os animes, mangás, música, games, cinema, novelas, etc. Assim, eu pensei no começo em escrever um pouco explicando cada uma dessas coisas, mas se eu fizesse isso acho que este espaço viraria um glossário ao estilo Wikipedia. Isso sem falar que estes elementos vivem no inconsciente coletivo da maioria das pessoas, até mesmo dos brasileiros, só a nomenclatura que é um pouquinho diferente.
Vamos partir então do pressuposto de que no Japão tudo vira mangá, tudo é mangá ou tudo algum dia será um mangá. Parece até uma visão generalizada, mas a verdade é que os quadrinhos japoneses refletem uma boa parte do que acontece na sociedade japonesa. É possível estudar a história do Japão, aprender coisas sobre comida e saber os costumes da sociedade.
Eu fiquei espantado quando fui ao Japão pela primeira vez no ano passado e me dei conta de que quase tudo aquilo que tinha lido através dos quadrinhos existia de verdade. Enquanto nós, que tivemos outra criação e cultura, viajamos nas histórias dos mangás achando que tudo é a mais pura invenção de um 漫画家(mangaká) super criativo, basta colocar os pés no Japão para perceber que muitas coisas que acontecem nas histórias são na verdade influências da sociedade e dos costumes locais.
Os mangás, que ganharam força no Japão logo depois da Segunda Guerra, enraizaram-se nos meios de comunicação de forma impressionante. Dessa maneira, as histórias em quadrinhos japonesas deixaram de ser sinônimo de histórias desenhadas para a criançada. No Japão mangá é coisa de adulto também. Existem muitos gêneros de mangá começando com os infantis, aventura, suspense, ação, romântico, terror, humor, culinário, pornografia e assuntos sérios como o homossexualismo, doenças congênitas, câncer, etc. O universo dos mangás é vasto. No Brasil existem mais de 40 títulos de mangá (são apenas a ponta do iceberg!) todos com estilos completamente diferentes.
Quando eu digo que no Japão tudo vira mangá ou vem do mangá, eu também estou querendo dizer que a mídia japonesa é fortíssima. Quase sempre jornal, tv, cinema, games, produtos e os mangás encontram uma forma de se interligar. Não é incomum um mangá se tornar uma novela, filme ou vice-versa. Afinal, um mangá é uma história com um Storyboard praticamente pronto.
Um exemplo do que estou falando é a mais nova novela de inverno do canal japonês TBS chamada だいすき!!
(Daisuki!!) que conta a história de Yuzu Fukuhara e Sousuke Sawada, um casal de namorados com deficiência mental (知的障害). Um dia enquanto está indo para o instituto, Sousuke acaba morrendo atropelado. Em meio a tristeza da morte do namorado, Yuzu descobre que está grávida. E mesmo indo contra a opinião da mãe, Yuzu decide ter o filho. Assim, começa a história de uma família que se une na luta diária contra o preconceito. Entre as situações que Yuzu tem que enfrentar estão a de deixar sua filha na creche e de fazer amizade com as mães das outras crianças que não a tratam normalmente. E sim, essa história dramática e emocionante que anda tirando lágrimas dos japoneses saiu de um mangá chamado だいすき!!ゆずの子育って日記 (Daisuki!! Yuzu no Ko Sodatte Nikki) criado em 2005 pela autora Mizuho Aimoto.
O ドラマ(Drama) ou J-Drama como é chamado o gênero de novelas japonês tem algumas características próprias. As novelas são exibidas uma vez por semana e tem em média apenas 11 episódios, o que se assemelha a uma minisérie brasileira. Nos J-Dramas apenas poucos personagens, geralmente dois ou três principais tem suas histórias aprofundadas permitindo um equilíbrio melhor na história. Fora isso ainda existe uma característica que as vezes me incomoda, que são as reviravoltas repentinas que não dispensam nem os protagonistas. As vezes você passa 9 episódios torcendo pelo protagonista e descobre que no episódio 10 ele pegou uma doença incurável e no 11 ele já está em um caixão. Mas fora isso as novelas japonesas são muito interessantes e além de possuírem estilos diferentes atraem os mais diversos tipos de público, incluindo muitos jovens. Eu, em particular, prefiro as comédias românticas e as histórias de superação de dificuldades (tema que também é recorrente nos mangás).
Daisuki!! está em seu quarto episódio que será exibido no Japão dia 7 de fevereiro, quinta-feira ás 22h. Esta série que é exibida todas as quintas já chega a internet na sexta-feira de manhã. E assim quem está em outro país e quer assistir a novela acaba fazendo o download rapidinho. Essa velocidade dos fãs em colocar os episódios na internet se deve a tecnologia digital usada nos televisores japoneses que permite que um computador capte o sinal direto no computador. A tecnologia da tv digital é a mesma que os brasileiros passaram a usar em dezembro do ano passado.
Este ano pela primeira vez os brasileiros terão a oportunidade de assistir a uma novela legitimamente japonesa. Haru e Natsu: As cartas que não chegaram será veiculada pela Rede Bandeirantes em Comemoração ao Centenário da Imigração Japonesa no Brasil. Com 8 episódios, Haru e Natsu conta a história de duas irmãs, uma que ficou no Japão e a outra que veio ao Brasil a procura de melhores condições de vida.
Para terminar, eu só queria dizer que enquanto Hollywood adapta para o cinema mangás como Speed Racer e Dragon Ball, os japoneses já fazem isso há séculos em suas novelas e filmes.
Dicionário:
知的障害(Titeki Shougai) : Deficiência Mental.
漫画家 (Mangaká): São os autores de mangá.
大好き (Daisuki): Em japonês significa "Gosto Muito", mas tem a mesma força do "Eu amo você" que em japonês seria 愛してる(Aishiteru) que os japoneses não costumam usar muito por ser um elogio dispensado na maioria das vezes as esposas e maridos, enquanto Daisuki é mais casual. Assim, だいすき!!ゆずの子育って日記 (Daisuki!! Yuzu no Ko Sodatte Nikki) seria traduzido como "Amo você!! O diário de criação da filha da Yuzu".