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Bravo!, 1/10/2007

Quem era mesmo o marido dela?

MARIANA SHIRAI

"Yoko Ono- Uma Retrospectiva'' mostra no Brasil a produção e o pensamento da viúva de John Lennon, que se tornou um nome fundamental para a arte feita hoje

Michael Ochs
yoko
Hoje, mais do que nunca, a artista encontra um lugar seu

Feche os olhos e pense em Yoko Ono. Agora faça o mesmo sem que a imagem de John Lennon apareça também em sua mente. Durante quase quatro décadas, essa tem sido uma tarefa quase impossível, mas, por meio de seu trabalho e vida, Yoko já deixou sua marca na cultura. E hoje, pela maneira de se criar e consumir arte, em que a produção audiovisual se mistura com a música tocada nas rádios e uma frase escrita nos muros é uma ação tão artística quanto política, Yoko encontra finalmente um lugar plenamente seu. A exposição Yoko Ono — Uma Retrospectiva abre dia 10 deste mês na capital paulista e oferece a chance de entrar em contato com a obra da viúva mais famosa do mundo. Os mais de 200 objetos e os oito vídeos espalhados pelo prédio do Centro Cultural Banco do Brasil - CCBB, na região central de São Paulo, mostram a diversidade pulsante dos seus 50 anos de carreira. Organizada pelo Museu de Arte Moderna Astrup Fearnley, de Oslo, na Noruega, em parceria com os escritórios Studio One, de Nova York, e Emílio Kalil/Gabinete Cultura, de São Paulo, a exposição junta obras do acervo pessoal da artista a outras que foram exibidas na mostra Horizontal Memories ("memórias horizontais"), que esteve em Oslo e Zurique. A exposição mapeia a importância de Yoko para a arte contemporânea.

Yoko já era uma artista conhecida desde meados da década de 50, quando usava seu loft em Nova York para promover performances e concertos. Na época, ela e ra integrante do grupo Fluxus, cuja principal proposta era quebrar barreiras entre o que era ou não arte, levando para a elaboração das obras elementos do cotidiano. O Fluxus reunia artistas como o alemão Joseph Beuys (1921-1986), marco para a arte do século 20, e o "pai" da videoarte, Nam June Paik (1932- 2006). Em 1966, Yoko conheceu John Lennon, a face mais inquieta dos Beatles, na Indica Gallery, em Londres, em sua mostra Unfinished Paintings and Objects ("pinturas e objetos inacabados"). Parecia improvável naquele momento que um ícone da juventude encontrasse afinidades com uma artista japonesa de vanguarda. Mas havia mais do que clichês em jogo. Lennon sentia-se encurralado na função de modelo de bom rapaz para sua geração e num casamento — com Cynthia Powell — que mais tarde caracterizou como tedioso. Nesse contexto conservador e asfixiante, ocorreu o encontro. Faltava uma hora para a abertura da exposição de Yoko quando o dono da Indica Gallery, John Dunbar, trouxe John Lennon para visitar a exposição. Entre as obras expostas estava Ceiling Painting ("pintura no teto"), uma escada branca de onde, do topo, John pôde ler, através de uma lupa, a palavra " sim", escrita em minúsculas letras. O impacto de otimismo e liberdade da obra, que integra a mostra do CCBB, era exatamente o que John precisava.

Ainda hoje, inúmeros fãs dos Beatles culpam de alguma forma Yoko pelo fim da banda. A influência da artista no grupo é de fato inquestionável. Mas isso tem mais a ver com sua contribuição em expandir os horizontes artísticos da banda do que provocar o final da beatlemania. Yoko aparece quando as prioridades e responsabilidades entre John, Paul, George e Ringo estavam sendo reavaliadas. Eles deixavam de ser uma gangue de adolescentes e se firmavam como artistas com projetos nem sempre comuns. A partir de 1968, quando John e Yoko já formavam um casal literalmente inseparável, a influência das idéias do Fluxus começou a aparecer no trabalho de Lennon. "Era uma época em que havia uma sofisticação na produção musical. Todo mundo estava obcecado em tocar da melhor forma possível e de maneira complicada, inclusive Paul McCartney. Mas o que John queria era fazer o tipo de rock primitivo e básico de Helter Skelter", disse a BRAVO! o crítico musical britânico Simon Reynolds, autor de Beijar o Céu (Editora Conrad). A abertura para diferentes sonoridades já vinha sendo explorada pelos Beatles principalmente a partir do álbum Rubber Soul, de 1965. Já no Álbum Branco (1968), em que figura a canção citada por Simon, há não só uma abrangência musical ainda maior como também uma forte indicação de que os quatro músicos começavam a tomar diferentes direções artísticas. É a partir desse disco que Yoko passa a acompanhar as gravações da banda, chegando até a entoar a única frase da carreira dos Beatles cantada apenas por uma mulher, na faixa The Continuing Story of Bungalow Bill. Ainda no mesmo disco, Lennon compôs Revolution 9, uma colagem de sons dissonantes claramente vinculada à música experimental de John Cage (1912-1992), compositor cujos conceitos inspiraram a arte produzida pelo Fluxus.

Fluxus da Arte

Ainda em 1968, John e Yoko lançam Unfi nished Music No 1: Two Virgins, disco que ficou conhecido pela fotografia da capa, que estampava o casal nu. Era o início de uma parceria que culminaria no desenvolvimento da faceta musical de Yoko. Filha de uma família japonesa abastada, ela havia iniciado seu aprendizado musical muito cedo, incluindo aí noções de harmonia e composição adquiridas em uma escola de Tóquio para crianças em idade pré-escolar. "Enquanto os Beatles ainda estavam juntos, John e Yoko fizeram álbuns extremos. Era quase uma não-música, experimentos de arte que não usavam tinta, e sim sons", diz o crítico Simon Reynolds. Yoko, então, parte também para uma carreira musical. Ao todo, ela lançou 24 álbuns, incluindo parcerias com Lennon e resultados da Plastic Ono Band, um grupo experimental pelo qual passaram músicos como Eric Clapton, George Harrison, Ringo Starr e Keith Moon — além , é claro, de John. "Ela consegue tirar coisas interessantes de outros músicos com quem trabalha. Eric Clapton, a meu ver, toca uma música muito mais interessante ao lado dela; e John Lennon, uma guitarra incrivelmente primitiva e agressiva. E em relação à sua música, de certa maneira, ela foi uma pioneira do pós-punk", diz Simon

Misture a palavra "arte" e a palavra "cotidiano". Espantoso ou não, o resultado dessa soma pode chegar perto do que alguns artistas chamaram, no começo da década de 60, de Fluxus. A importância de Yoko Ono para a cultura se deve à sua capacidade de reunir dois universos: o pop para o grande público e as pesquisas mais refinadas nas artes. Ela tem sido a um só tempo personagem para o mundo e criadora que soube fazer uso desse mesmo personagem. Essa posição tornou Yoko uma artista única. Uma criadora que fez dos fatos de sua existência a matéria-prima. Como se ela tivesse levado ao extremo as idéias do Fluxus, que queria eliminar a separação entre arte e vida. O Fluxus, grupo organizado a princípio pelo lituano George Maciunas, se manifestou nas mais diversas formas artísticas, muitas vezes mesclando-as. Performances, por exemplo, foram emblemas da produção do Fluxus e de Yoko. No impactante Cut Piece ("peça de corte"), de 1964, ela se senta no chão do palco de um teatro e convida o público a cortar sua roupa. "Um trabalho que é seguramente dos mais radicais na história da performance, por revirar pelo avesso a relação com o público", diz o crítico Paulo Herkenhorff sobre Cut Piece. "É a indicação da enorme disponibilidade de Yoko em estar com o outro da maneira como este desejar. Essa relação define um código, que é a aceitação plena."

O Fluxus não era um movimento e sim uma maneira de pensar e de agir. Paulo ressalta: "O Fluxus valorizava um continuum de pequenos gestos, dando, por meio da arte, densidade à vida". Naquele tempo, incorporar Fluxus ao cotidiano, assumindo uma atitude ativa, significava, ainda, ter uma posição política clara, principalmente para personalidades tão visadas como o casal John e Yoko. Dessa maneira, eles promoveram uma intensa campanha pela paz e pelo fim da Guerra do Vietnã, que resultaria não só em canções como Give Peace a Chance, de Lennon, mas também em performances conjuntas, como o Bed-In. O protesto foi realizado duas vezes em 1969 pela dupla, e consistia em passar uma semana em uma cama de hotel dando entrevistas à imprensa sobre a paz. No mesmo ano, eles alugaram espaços de publicidade em 11 cidades do mundo para espalhar cartazes com a mensagem War is over! (If You Want It), que pode ser traduzida por "A guerra acabou! (se você quiser)", numa iniciativa próxima da intervenção artística agora. Atitudes assim podem ser vistas neste momento nas mais diferentes mostras internacionais, nas obras de artistas como o italiano Maurizio Cattelan (mestre no uso do humor), o tailandês Rirkrit Tiravanija — cozinheiro de jantares para o público, e a refeição é sua obra — ou a inglesa Tracy Emin, que faz da cama um palco para suas intenções políticas.

As idéias que Yoko lançou e tornou popular há mais de 40 anos orientam uma arte calcada na questão do artista e suas relações com o observador. Mas a mudança de posição dos espectadores vai além da mera interação no trabalho de Yoko. Em entrevista a BRAVO! (leia mais na página ao lado), ela diz : "Nós artistas dividimos nossos sonhos com as pessoas. Eu tiro uma pomba do chapéu, mas revelo para a platéia como isso é feito e, mais ainda, convido a todos a participarem do ato". Seguindo a estética Fluxus do it yourself ("faça você mesmo"), ela expande a atuação do público a ponto de dar a ele a possibilidade de se colocar como autor da obra de arte por meio de instruções preconcebidas. No livro Grapefruit (veja extratos nesta página e nas demais), de 1964, Yoko mostra o caminho para que o leitor crie, mesmo que apenas mentalmente, peças de arte. "Ao contrário dos rumores, eu não sou louca. Eu apenas pareço louca. Então, me deixem em paz!" Com o pedido, Yoko Ono convida a todos a seguirem mais essa instrução.

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